quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Por que votei em Haddad?

Depois de muitas conversas, ponderações, angústias e esclarecimentos, tomei minha decisão. Votarei em Fernando Haddad no domingo. Sigo com dúvidas, questões e críticas. Pessoas que admiro e em quem confio muito me apontaram problemas e erros indiscutíveis na gestão de Haddad e que precisam ser cuidados daqui pra frente. O tratamento dado à população em situação de rua é um deles. A GCM é outro. As condições de atendimento nos postos de saúde nas periferias também. O vice Chalita desperta minha desconfiança e trauma pós-golpe. Além de outros pontos que com certeza surgirão a cada nova conversa. Mas junto a todas essas questões, sem eliminar o lugar e a importância de nenhuma delas, não posso e não vou excluir da minha escolha, e dos próximos passos que acredito para esta cidade, todas as experiências positivas que eu vivenciei ou acompanhei de alguma forma nos últimos tempos. Outras pessoas em quem também confio muito me apresentaram a mudanças e projetos importantes que foram feitos nas periferias na gestão Haddad, sobretudo no que se refere à educação (os comentários estão num post aqui embaixo). Além disso, tenho percebido, cada vez mais, que política é também experiência. E qualquer decisão tomada sem (também) me levar em conta seria uma decisão deslocada, equivocada, autoritária até. Então, falando do que vivi: ocupar o espaço público, em ciclovias, carnavais e na Paulista Aberta me fez começar a olhar para o lugar onde eu sempre morei com olhos novos. Toda vez que caminho, danço ou pedalo por São Paulo, volto com mais questões e ideias. Com alegrias, entusiasmos e tbm incômodos, revoltas. Volto com olhares que se ampliam. Com um corpo que se percebe e percebe os outros. Volto me conhecendo melhor, por conhecer mais o espaço onde habito e as pessoas que compartilham esse espaço comigo. Por começar a visualizar e querer entender as contradições de uma cidade. Reconheço que essa é uma percepção ainda limitada, sim. Mas é também uma voz nova que conversa comigo e que me diz que ainda há muito pra conhecer e muito pra fazer. Por isso sigo com esperança de continuidade de ações que sejam transformadoras e positivas para cada vez mais pessoas. Não só pra mim, não só para os jovens de classe média alta, que fazemos parte do grupo que mais aprovou a gestão Haddad. Desejo, profundamente, que o que foi feito de bom seja ampliado e aprimorado por toda a cidade de São Paulo. Que a gente saiba continuar fazendo críticas, mas também saiba manter e sustentar as conquistas. Que a gente não permita que pessoas e projetos conservadores, discriminatórios e totalitários se apropriem dos nossos espaços internos e externos. Que injustiças não sejam silenciadas, toleradas ou esquecidas. Que, juntos, sejamos mais fortes que qualquer tipo de violência, neste e em qualquer outro tempo.

sábado, 24 de setembro de 2016

Texto, faz tempo que a gente não conversa


Querido texto,

Faz um tempão que a gente não conversa, né?
Vim aqui pra te dizer que vc faz uma falta danada na minha vida. Até que vc tenta aparecer de vez em quando, naquelas anotações soltas e meio desconexas nos cadernos que eu sempre levo na mochila. Mas tem sido raras as vezes em que eu paro pra organizar essas palavras, dar uma forma a vc e te colocar para os outros te lerem.
Vc apareceu na minha vida, de fato, em 2013. Lembra disso? Me ajudou a segurar uma barra bem pesada. Quando eu pensei que fosse enlouquecer de verdade, vc vinha e me chamava pra bater um papo. Aí a gente organizava juntos e em palavras o que era muito difícil de ver e sentir.
Eram textos muito loucos que nasciam desses nossos encontros. As palavras brotavam, doíam, e eu pensava que quando vc se apresentasse ao mundo, ninguém ia querer te ler. Na minha cabeça, vc poderia me machucar e machucar muita gente. Eram memórias e histórias paradas por tanto tempo, que eu tive muito medo de me enxergar nelas e de enxerga-las “fora” de mim, assim, pra todo mundo ver.
Lembra aquela vez que a gente falou sobre a morte da Andreia, minha irmã? Caraca. Me lembro muito bem de quando escrevi essa história, em uma aula de técnica de redação na faculdade. De técnica vc não tinha nada, era só aquele turbilhão que parecia que ia me explodir. Minha pálpebra esquerda tremia e eu pensei que fosse desmaiar. Mas vc segurou a minha mão, como quem diz “vc é forte, continua, que eu preciso nascer”. E foi lindo.
O nosso maior interlocutor era um professor querido da faculdade. Pra ele eu não tinha vergonha de te mostrar. Vc podia ter a cara e a forma mais esquisitas, mas ele estava lá de coração e braços abertos pra te ouvir, nos ouvir e nos receber.
De 2013 para cá foram 19 cadernos e bloquinhos que guardo perto dos meus livros, somados às incontáveis anotações no bloco de notas no celular. Quem sabe um dia todos eles não se juntam e decidem virar um livro, hein? Seria massa.
Acontece que agora eu me formei na faculdade. Não tem mais aquele professor pra dar a nota 10 que me assegurava que vc estava bom pra ir pro mundo. Não temos mais aquelas professoras que questionavam, encorajavam, reforçavam que nós éramos ótimos.
Essa coisa de não ter mais professores por perto é difícil, viu. Agora somos só nós dois.
E nesse processo de estarmos sozinhos no mundo, vc deve ter percebido como eu sou dura com vc. Tem dias que nem deixo a ideia amadurecer e já vou logo te abortando. Em outros, eu fico te comparando ao que vc já foi, à linguagem que eu usava pra te criar.
Aquela linguagem parece não te servir mais, é como uma roupa que ficou apertada durante o nosso crescimento. Sei que às vezes eu fico brava quando percebo que a ideia que eu tinha de mim não me cabe mais. Sou resistente pra caramba.
Quando vc decide se mostrar com a sua cara nova, te chamo de contraditório, de simples demais, de bobo, de imaturo, de infantil. Eu não te deixo ser essa criança que, no fundo, eu sei que vc quer ser.
Na real, vc sempre foi criança. Só que nos últimos anos essa criança trouxe muita dor, intensidade e complexidade. E agora vc tem vontade de se manifestar de outras formas, mais leves talvez, e eu insisto em te dizer que o mundo não vai te aceitar assim.
Insisto em dizer que vc tem que voltar a ser como antes, falar com aquela voz adulta séria e pesada. Te digo que vc não pode mostrar pro mundo as minhas alegrias, desejos, tristezas e angústias do jeito que vc quiser. Fico querendo controlar a sua forma de nascer.
Sabe, isso é muito violento… Não posso fazer isso com vc, que sempre está pronto pra me ajudar. Por que eu não permito que vc se manifeste assim, do jeito que vc é hoje, como bem entender? Por que não te deixo ser contraditório, esquisito e até bobo?
Talvez aqui seja importante te dizer que o fato de eu bloquear todas essas suas tentativas de se expressar é muitas vezes reforçado pelo mundo chato em que a gente vive. É um mundo cheio de gente legal, sim, mas também tem muita gente mala que fica julgando, interpretando e maldizendo os textos dos outros. E não falo aqui só dos textos escritos, não. Julgam as nossas falas e até o que não dizemos! Fazem isso sem perguntar o que queríamos dizer. Onde já se viu, né?
E aí hoje eu percebi que eu estava fazendo com vc a mesma coisa que essas pessoas chatas fazem. Não estava te deixando ser feliz! Não estava te deixando dançar pelo mundo. Estava logo te julgando e te expulsando da minha vida. E aí ficamos um tempão separados.
Por isso venho te pedir sinceras desculpas. Desculpas por duvidar de vc, desconfiar das suas mudanças, exigir que vc seja quem não é mais, quem vc não mais precisa ser.
Tudo bem se vc precisar de um tempo pra se recompor de tantos maus tratos. Mas quero te dizer que estou aqui quando vc quiser voltar. Ainda não consigo ser uma adulta tão generosa quanto aqueles professores que tanto te ajudaram a dar os primeiros passos. Mas prometo que vou me esforçar pra ser uma pessoa melhor pra vc e pra mim. Quem sabe a gente não volta a conversar?

Um abraço bem quentinho e com muitas saudades,

Pri