sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Morte precoce

O ritual diário de deslizar os dedos pela tela de meu celular, a fim de me inserir nas atualidades postadas pelos meus conhecidos nas redes sociais, tem se tornado entediante – se é que sempre não o foi. Principalmente nestes meses que antecedem as eleições, tenho sentido que a complexidade inerente ao diálogo tem sido pressionada ao limite, até se tornar um estreito post de Facebook.

“A Marina é evangélica e eu não voto em evangélicos”; “A Dilma é do PT e eu não voto em partido de corruptos”; “Aécio Never”. Após cada debate televisivo entre os presidenciáveis, a enxurrada de opiniões e impressões – forte, assustadora, porém passageira – muitas vezes vem para eliminar qualquer início de pensamento.

Urgentes em informar seus curtidores sobre o destino de seu voto à Presidência da República, muitos de meus amigos facebookianos acabam entrando em uma guerra de singularidades. Expressam-se sem considerar a existência do Outro – tanto o interlocutor quando o objeto da fala -, descarregam frases engessantes e engessadas, abortando o pensamento antes que este pudesse se transformar em feto.

Há quem diga que vivemos, hoje, uma realidade que permite o exercício de nossas liberdades, principalmente no que diz respeito às possibilidades de comunicação em rede. Sim, as potencialidades da internet são inúmeras: organizamos e conectamos movimentos sociais; acessamos e produzimos conteúdos que no passado poderiam ter sido censurados; criamos novos espaços de convivência.

Ao mesmo tempo, muitas dessas flechas que - sob a forma de incógnitas - apontam para novos olhares são derrubadas pela pressa de transformar contos em fábulas. Acabamos por informar muito e comunicar pouco, por concluir a síntese sem antes exercer o duro diálogo com a antítese. Nas redes sociais e fora delas, falta-nos tempo silencioso para compreender a pluraridade, que, como afirmou Hannah Arendt, é condição humana.